domingo, 23 de novembro de 2014

Interessante crítica de Roberta Resende do site Migalhas.com sobre meu livro


 

Fundamentos do Direito Penal Mínimo - Uma Abordagem Criminológica

terça-feira, 18 de novembro de 2014






Autor
: Rodrigo Murad do Prado
Páginas: 135




"O Estado Penal nunca conseguiu, e nunca conseguirá,
substituir o Estado Social. Não é essa sua função
."

(Rogério Greco, procurador de Justiça, na apresentação à obra)

Nos dias que correm, o Direito Penal brasileiro sofre um processo de acirramento de repressão àqueles considerados "inimigos"; a sociedade é bombardeada pelo discurso da mídia, que se fortifica na sensação social de impunidade diante da crueza de alguns crimes; com base nessas informações, boa parte da população sente-se apta a tratar questões de ordem penal, processual penal e de política criminal, embora o "crime, como fenômeno individual e social, tenha raízes e motivações extremamente complexas, impossíveis de serem capturadas apenas em uma variável", qual seja, o senso comum emergente da sensação de insegurança.
O que percebe e anota o autor nessas reflexões indignadas e oportunas é exatamente a frequente e indevida utilização do Direito Penal como solução para todos os males da sociedade, como se aumentar penas, criar novos tipos penais, mitigar garantias fosse dar conta de todo o processo educacional e civilizatório que se há de constantemente empreender.
Dentro desse quadro, a obra busca retratar as diversas correntes do Direito Penal atual, de um extremo ao outro – desde os abolicionistas aos adeptos do Direito Penal do Terror.
E por falar em Terror, o autor adverte que as atrocidades praticadas pelos Estados nazista e fascista de Alemanha e Itália, nas décadas de 1930 e 1940, encontravam respaldo na lei penal formalmente aprovada pelos então representantes do povo, leis que passaram a abrigar um processo penal "extremamente inquisitivo, que tolhia os direitos de defesa e enxovalhava a pessoa humana", tendo como fundamento e alvo a punição do diferente – todo o processo que culminaria com a perseguição e morte de milhares de seres humanos começou com a identificação de pessoas “indesejadas ao convívio”. Em ótima síntese, o autor dispara: "O procedimento era sumário. A pena era a de morte! A execução da pena era cruel."

Nessa esteira, desenvolve um cuidadoso capítulo em que rebate criticamente as proposições do Direito Penal do Inimigo, sustentadas por Jakobs e Meliá, demonstrando como a "verdadeira operação de guerra em que direitos são relativizados, flexibilizados e até eliminados" não contribui para a diminuição da criminalidade; antes, leva a um direito penal seletivo, que no caso brasileiro estigmatiza os setores menos favorecidos da sociedade, "verdadeira ditadura sobre os pobres".
Em todos os capítulos, pugna pela preservação das garantias penais e processuais penais para todos, sem exceção, frisando o papel do processo penal como proteção do cidadão contra eventuais arbitrariedades do Estado no exercício do poder punitivo.

A leitura é extremamente prazerosa. Em pouco mais de cem páginas, verdadeiro manifesto iluminista.

Sobre o autor :
Rodrigo Murad do Prado é defensor público em MG. Doutorando em Direito Penal; mestre em Acesso à Justiça e Direito Processual; pós-graduado em Criminologia, Política Criminal e Segurança Pública. Professor universitário.

__________
Ganhadores :
Thiago Melo, técnico judiciário em Recife/PE ;
Vinicius Barbosa Nogueira, de Osasco/SP ;
Karine Maria de Almeida, de São João Del Rei/MG ;
Rafael Gomes Duarte, advogado em Barretos/SP; e
Ana Ilse Michels, de Blumenau/SC.

Roberta Resende Roberta Resende é formada pela faculdade de Direito do Largo de São Francisco/USP (Turma de 1995) e pós-graduada em Língua Portuguesa, com ênfase em Literatura.

domingo, 9 de novembro de 2014

Direito Constitucional


Aos estimados alunos, informo que já estou terminando de revisar meu próximo livro que sairá, também,  pela editora Lumen Juris e será intitulado Interpretação, Concepções Constitucionais e Controle de Constitucionalidade.

O livro A participação popular no Controle Concentrando de Constitucionalidade: amigo da corte está à disposição no site da Livraria e Editora Sérgio Antônio Fabris (SAFE) pelo link http://www.fabriseditor.com.br/site/livro.asp?idProduto=10719

http://www.fabriseditor.com.br/site/livro.asp?idProduto=10719


Recomendo, para aqueles que desejam aprofundar o tema Interpretação Constitucional, as seguintes obras:

http://www.ciadoslivros.com.br/constituicao-e-politica-vol-3-128920-p7452?utm_source=Shopuol&utm_medium=Comparadores&utm_campaign=Shopuol


sexta-feira, 31 de outubro de 2014

Homenagem

Parabéns ao Doutor Francisco Vani Bemfica fundador da Faculdade de Direito de Varginha-MG, Professor de Direito Penal desde a década de 60 e juiz de direito aposentado. 

Parabéns pela coerência, sabedoria e lucidez.


quarta-feira, 29 de outubro de 2014

Estou lendo e recomendo...

Pessoal,

Estou lendo e recomendo a leitura do livro Teoria da Constituição do Professor José Emílio Medauar. Para acessar o site da editora Lumen Juris, clique na imagem.

http://www.lumenjuris.com.br/?sub=produto&id=3618

terça-feira, 14 de outubro de 2014

Lançamento - Livro "Fundamentos do Direito Penal Mínimo: uma abordagem criminológica"

Pessoal,

Acabo de publicar pela Editora Lumen Juris (www.lumenjuris.com.br) o livro intitulado Fundamentos do Direito Penal Mínimo: uma abordagem criminológica. 

Nesta obra realizado uma análise histórica e sociológica dos principais movimentos de política criminal que influenciaram a criminologia e o direito penal.

Dentre outros, abordo o movimento de política criminal ocorrido na Alemanha Nazista (III Reich); Direito Penal do Terror; Abolicionismo Penal; Direito Penal do Inimigo; Movimento de Lei e Ordem; Direito Penal Mínimo ou Equilibrado e Direito Penal Latinoamericado.

Passo a abordar questões afetas à criminologia crítica como: labelling approach (etiquetamento); associação diferencial; anomia; hiperpunitivismo; punitivismo midiático; esquerda punitivista; direito penal simbólico; cárcere e fábrica e outros.

Questões como a coculpabilidade e vulnerabilidade são recorrentemente tratadas no livro.

No último capítulo, trato dos princípios básicos do Direito Penal, estudo o Direito Penal Mínimo e o proponho como modelo de política criminal justo e adequado à América Latina e, sobretudo, ao Brasil.

O livro conta com 135 páginas e pode ser adquirido diretamente no site da Editora Lumen Juris acessando o site www.lumenjuris.com.br ou clicando diretamente aqui:  http://www.lumenjuris.com.br/?sub=produto&id=3810Livro Fundamentos do Direito Penal Mínimo: uma abordagem criminológica


http://www.lumenjuris.com.br/?sub=produto&id=3810Livro Fundamentos do Direito Penal Mínimo: uma abordagem criminológica


quinta-feira, 11 de setembro de 2014

Embriagues ao volante: prova legal ou tarifada?

EMBRIAGUEZ AO VOLANTE. EXAME. ALCOOLEMIA. Antes da reforma promovida pela Lei n. 11.705/2008, o art. 306 do CTB não especificava qualquer gradação de alcoolemia necessária à configuração do delito de embriaguez ao volante, mas exigia que houvesse a condução anormal do veículo ou a exposição a dano potencial. Assim, a prova poderia ser produzida pela conjugação da intensidade da embriaguez (se visualmente perceptível ou não) com a condução destoante do veículo. Dessarte, era possível proceder-se ao exame de corpo de delito indireto ou supletivo ou, ainda, à prova testemunhal quando impossibilitado o exame direto. Contudo, a Lei n. 11.705/2008, ao dar nova redação ao citado artigo do CTB, inovou quando, além de excluir a necessidade de exposição a dano potencial, determinou a quantidade mínima de álcool no sangue (seis decigramas por litro de sangue) para configurar o delito, o que se tornou componente fundamental da figura típica, uma elementar objetiva do tipo penal. Com isso, acabou por especificar, também, o meio de prova admissível, pois não se poderia mais presumir a alcoolemia. Veio a lume, então, o Dec. n. 6.488/2008, que especificou as duas maneiras de comprovação: o exame de sangue e o teste mediante etilômetro (“bafômetro”). Conclui-se, então, que a falta dessa comprovação pelos indicados meios técnicos impossibilita precisar a dosagem de álcool no sangue, o que inviabiliza a necessária adequação típica e a própria persecução penal. É tormentoso ao juiz deparar-se com essa falha legislativa, mas ele deve sujeitar-se à lei, quanto mais na seara penal, regida, sobretudo, pela estrita legalidade e tipicidade. Anote-se que nosso sistema repudia a imposição de o indivíduo produzir prova contra si mesmo (autoincriminar-se), daí não haver, também, a obrigação de submissão ao exame de sangue e ao teste do “bafômetro”. Com esse entendimento, a Turma concedeu a ordem de habeas corpus para trancar a ação penal. Precedente citado do STF: HC 100.472-DF, DJe 10/9/2009. HC 166.377-SP, Rel. Min. Og Fernandes, julgado em 10/6/2010.
O julgado confirma o entendimento de que a Lei 11.705/2008, a pretexto de agravar a conduta de embriaguez ao volante, por atecnia, acabou atenuando.
Como ninguém é obrigado a fazer prova contra si mesmo, nem o exame de sangue ou o teste de “bafômetro” podem ser exigidos do motorista, acabando por inviabilizar a comprovação da materialidade delitiva.
Ao trazer a quantidade de álcool por sangue como elementar objetiva do tipo penal, o legislador restringiu os meios de prova destinados a comprovar a prática do crime. Uma espécie de prova legal ou tarifada, talvez.
A correção do equívoco será possível com nova alteração legislativa ou quiça com o avanço tecnológico apresentando novos aparelhos capazes de apurar a quantidade de álcool no sangue sem depender da concordância do motorista.
Enquanto isso, remanesce a infração administrativa que, diga-se de passagem, incute grande temor ao motorista. Uma fiscalização consistente e rotineira pelas Autoridades de Trânsito, culminando com a simples infração administrativa, pode ser mais eficaz que a intervenção do Direito Penal nesse caso, mormente diante do anacrônico tipo penal em comento.

Seleção policial e seletividade do sistema punitivo


Sou policial militar e estava em patrulhamento de rotina, por um local conhecido como ponto de tráfico de drogas, quando deparei com o réu e suspeitei dele. Por isso o abordei e encontrei, no bolso da sua bermuda, a droga mencionada na denúncia. Também estava com dinheiro e não soube explicar sua origem. Então lhe dei voz de prisão por tráfico e o conduzi para o Plantão Policial. Não o conhecia antes. Suspeitei dele em razão de suas vestes e pelo local em que se encontrava. O réu não reagiu ou esboçou qualquer reação por ocasião da abordagem. Ele colaborou com a operação policial. Ele disse que a droga era para seu consumo.
Com algumas variantes, mas normalmente com esse núcleo, é rotineiro deparar com depoimentos de policiais com aquele conteúdo.
Não se está efetuando qualquer juízo de valor acerca da atuação do policial. Até porque, ante o oceano que é a prática do tráfico de drogas perto da escassez de policiais que temos para combatê-lo, natural que haja critérios de eleição das pessoas que serão abordadas rotineiramente. É humanamente impossível que seja diferente.
Outrossim, apenas se está a lançar luz, com o objetivo de colocá-lo em debate, sob um ponto de atuação de uma das agências responsáveis pelo controle do crime, no caso a polícia.
O próprio Código de Processo Penal, no qual se baseou o policial para efetuar a busca pessoal, também já traz um critério seletivo que merece atenção. Vejamos:
Proceder-se-á à busca pessoal quando houver fundada suspeita de que alguém oculte consigo arma proibida ou objetos mencionados nas letras b a f e letra h do parágrafo anterior
Fundada suspeita é conceito subjetivo que depende não só do caso concreto, mas sobretudo de pré-conceitos daqueles que irão realizar a busca pessoal. Ou seja, quem são e como são as pessoas que costumam trazer consigo objetos ilícitos? E como normalmente agem essas pessoas?
É preciso, destarte, que haja um estereótipo das pessoas que sofrerão a incidência de uma busca pessoal. E, caso o indivíduo se encaixe naquele estereótipo, sofrerá a fiscalização.
A atuação do policial, evidente, não criou o crime de tráfico naquela situação. Mas possibilitou a sua descoberta e a inserção deste delito nas estatísticas oficiais.
Todavia, quantos outros indivíduos, que quiçá não teriam o estereótipo da fundada suspeita, também estavam traficando e passaram ilesos a uma abordagem policial?
A lição de Cesare Lombroso, de que é possível traçar um biótipo de delinquente, pode também ser analisada de forma inversa. Aquelas características por ele apontadas não são a causa do comportamento criminoso. Podem também ser a consequência. Ou seja, só os criminosos com aquele perfil é que seriam descobertos. O que não quer significar que todos os criminosos tenham aquele perfil.
Reitere-se que a atuação policial foi legítima. Mas aquela constatação empírica apenas reforça a ideia de que há uma seletividade de crimes e criminosos a ingressarem nas estatísticas oficiais. E isso cria uma espécie de retroalimentação: apenas aquele perfil de criminoso é descoberto e passa-se à conclusão de que apenas aquele tipo de pessoas cometem aquele delito. E só elas são objeto de atenção das instâncias de controle do crime.
São os estereótipos que, em grande parte, determinam para onde a polícia se deve dirigir e que tipos de pessoas deve abordar. As investigações empíricas- que se multiplicaram após o já clássico artigo de PILIAVIN e BRIAR e adoptando o seu método de observação participante- apresentam resultados particularmente convergentes. A polícia tende a deslocar-se para áreas habitadas por minorias desclassificadas e a abordar sobretudo as pessoas que- pela cor da pele, gestos, modos de vestir, corte de cabelo ou barba, etc- são a imagem exterior da desconformidade. Comparados com os outros- escrevem PILIAVIN e BRIAR, descrevendo a situação norte- americana- os jovens negros e aqueles cuja aparência corresponde ao estereótipo do delinquente eram mais frequentemente abordados e interrogados, muitas vezes mesmo sem quaisquer indícios da prática de crime 9…0. A polícia justificava o seu tratamento seletivo em termos epidemiológicos: concentrando a sua atenção sobre aqueles jovens que, segundo acreditava, mais provavelmente cometeriam crimes.
A força dos estereótipos radica, assim, no postulado da congruência entre a imagem exterior, a conduta e a própria identidade. É este mesmo postulado que leva a polícia a encarar com particular suspeição as descontinuidades entre a conduta, a imagem exterior e o próprio cenário. E, a acreditar, v.g, que para reproduzir, ainda uma vez, a experiência norte-americana- um jovem branco num bairro de negros procura naturalmente sexo ou droga; e que, inversamente, um jovem negro num bairro residencial elegante se prepara naturalmente para qualquer crime patrimonial. (DIAS, Jorge de Figueiredo. ANDRADE, Manuel da Costa. Criminologia: o homem delinquente e a sociedade criminógena. 2ª ed. Coimbra: Coimbra Editora, 1997. p. 451-452)

terça-feira, 29 de julho de 2014

Teoria da Associação diferencia e a Cifra negra


 A teoria da associação diferencial, formulada por Edwin H. Sutherland, baseia-se na teoria da desorganização social acerca do comportamento criminal. Segundo Sutherland, “a função social do crime é de mostrar as fraquezas da desorganização social. Ao mesmo tempo que a dor revela que o corpo vai mal, o crime revela um vício da estrutura social, sobretudo quando ele tende a predominar. O crime é um sintoma da desorganização social e pode sem dúvida ser reduzido em proporções consideráveis, simplesmente por uma reforma da estrutura social.”

Assim, para Sutherland, “a conduta criminal sistemática é conseqüência imediata da associação diferencial em uma determinada situação na qual existem conflitos culturais e, em ultima instância, uma desorganização social.”

Essa teoria é uma concepção sociológica do comportamento criminal, mediante um processo no qual o indivíduo se torna criminoso em contato com outras pessoas do mesmo meio, interpretando a lei de maneira favorável. Essa teoria é chamada de associação diferencial, pelo fato de que os princípios do processo pelo qual se desenvolve o comportamento criminoso são os mesmos do processo através do qual se desenvolve o comportamento legal, sendo uma associação com pessoas que se empenham no comportamento criminoso sistemático, tudo num processo de aprendizagem (learning process) onde a conduta criminal é algo que se aprende.

Entendemos que a maior contribuição de Sutherland à criminologia, foi a conclusão de que existe um equívoco em se afirmar que as classes pobres é que cometem uma porção maior de crimes, conforme revelam as estatísticas sociais.

Foi Sutherland quem cunhou a expressão crime do colarinho branco em sua obra White-Collar Crime, expressão que na França tomou o nome de delit de chevalier (delito de cavalheiros) ecrinalité des affaire (negócios como objeto de atos criminosos), ou seja, a criminalidade econômico-financeira, praticadas pelos magnatas, através dos negócios escusos, fraudulentos, realizados em nome de suas promessas. Um tipo de crime praticado por pessoas de alto nível social, no curso de sua ocupação comercial ou industrial.

Considera-se que os princípios do processo pelo qual se desenvolve o comportamento criminoso são os mesmos do processo através do qual se desenvolve o comportamento legal, sendo uma associação com pessoas que se empenham no comportamento criminoso sistemático, tudo num processo de aprendizagem onde a conduta criminal é algo que se aprende. A maior contribuição de Sutherland para a criminologia foi a conclusão de que existe um equívoco em se afirmar que as classes pobres é que cometem grande parcela de crimes, o que vai de encontro com as teorias da escola positiva, principalmente nos pontos que a escola ou seus teóricos falam do determinismo social. A teoria traz implicitamente que o crime não parte somente das classes sociais menos favorecidas - contrariando as ideias sustentadas pela Escola Positivista - mas também emerge no seio das classes mais favorecidas.
Segundo a teoria da associação diferencial (teoria do aprendizado social), o indivíduo desenvolve seu comportamento individual baseado nos exemplos e influências que possui. Nas comunidades pobres, cujo problema social é constante, nem sempre as influências são as ideais. Assim, em situações de conflitos, crianças e adolescentes tendem a agir de forma semelhante aos seus exemplos. Para esta teoria, o crime apresenta as seguintes proposições:

a. A conduta criminal se aprende;

b. Ela se aprende em interação com outras pessoas mediante um processo de comunicação;

c. A parte decisiva do aprendizado ocorre no meio das relações mais intimas do indivíduo com seus familiares;

d. A aprendizagem inclui técnicas de cometimento do crime;

e. Uma pessoa se converte em delinquente quando as definições favoráveis à violação da lei superam as desfavoráveis;

f. E contatos duradouros e frequentes têm influência maior pedagógica.

Ou seja, o homem aprende a conduta desviada e associa-se com referencia nela. A Teoria do Aprendizado Social parte da hipótese de que as bases da conduta humana têm suas raízes na aprendizagem que a experiência vital diária enseja ao indivíduo. O homem, segundo esta explicação, atua de acordo com as reações que sua própria conduta recebe dos demais, de modo que o comportamento individual acha-se permanentemente modelado pelas experiências da vida cotidiana. O crime não é algo anormal nem sinal de uma personalidade imatura, senão um comportamento ou hábito adquirido, isto é, uma resposta a situações reais que o sujeito aprende.

Em suas investigações sobre a criminalidade do colarinho branco, sobre a delinquência econômica e profissional e sobre os níveis de inteligência do infrator, Sutherland chegou à conclusão de que a conduta desviada não pode ser imputada a disfunções ou inadaptação dos indivíduos das classes mais baixas socioeconomicamente, senão à aprendizagem efetiva dos valores criminais, o que pode suceder em qualquer cultura.

Segundo Sutherland, o crime não é hereditário nem se imita ou inventa. Não é algo fortuito ou irracional: o crime se aprende. A capacidade ou destreza e a motivação necessárias para o delito se aprendem mediante o contato com valores, atitudes, definições e pautas de condutas criminais no curso de processos normais de comunicação e interação do indivíduo com seus semelhantes.

A conduta criminal se aprende em interação com outras pessoas, mediante um processo de comunicação. Requer, pois, uma aprendizagem ativa por parte do indivíduo. Não basta viver em um meio criminogênico, nem manifestar determinados traços da personalidade ou situações frequentemente associadas ao delito. Não obstante, em referido processo participam ativamente, também, os demais.

A parte decisiva do processo de aprendizagem ocorre no seio das relações mais íntimas do indivíduo com seus familiares ou com pessoas do seu meio. A influência criminógena depende do grau de intimidade do contato interpessoal. A aprendizagem do comportamento criminal inclui também a das técnicas de cometimento do delito, assim como a da orientação específica das correspondentes motivações, impulsos, atitudes e da própria justificação racional da conduta delitiva.

Uma pessoa se converte em delinquente quando as definições favoráveis à violação da lei superam as desfavoráveis, isto é, quando por seus contatos diferenciais aprendeu mais modelos criminais que modelos respeitosos ao Direito. As associações e contatos diferenciais do indivíduo podem ser distintos conforme a frequência, duração, prioridade e intensidade dos mesmos. Contatos duradouros e frequentes devem ter maior influência pedagógica, mais que outros fugazes ou ocasionais, do mesmo modo que o impacto que exerce qualquer modelo nos primeiros anos da vida do homem costuma ser mais significativo que o que tem lugar em etapas posteriores; o modelo é tanto mais convincente para o indivíduo quanto maior seja o prestígio que este atribui à pessoa ou grupos cujas definições e exemplos aprende.

Precisamente porque o crime se aprende, não se imita. O processo de aprendizagem do comportamento criminal mediante o contato diferencial do indivíduo com modelos delitivos e não delitivos implica a aprendizagem de todos os mecanismos inerentes a qualquer processo deste tipo.

A teoria do aprendizado social ou da associação diferencial traça um modelo teórico generalizador, capaz de explicar também a criminalidade das classes médias e privilegiadas. Contribuiu para fomentar cientificamente e dar sentido a conceitos que, desde então, encontram na ideia genérica de aprendizagem uma referência obrigatória: os conceitos de reeducação, modificação de conduta, aprendizagem compensatória etc. Até mesmo as teorias subculturais encontraram um reforço valioso na concepção de Sutherland, que as complementa, incorporando, ademais, um significativo caráter diferencial: a ideia de que o crime não procede da desorganização social, senão da organização diferencial e da aprendizagem. A teoria enfatiza o impacto das relações de ponto a ponto sobre a determinação em direção ou distância do desvio social.

Em resumo, para a teoria da associação diferencial é no interior de grupos e no contato com criminosos experientes que são transmitidos aos jovens delinquentes informações e ensinamentos sobre como cometer crimes e sobre como justificar esse comportamento.

Cifra Negra


Sabe-se que nem todo delito praticado é tipificado ou investigado pela polícia judiciária, ou mesmo, denunciado, julgado e o seu autor condenado. Nesse sentido, o termo cifra negra (zona obscura, "dark number" ou "ciffre noir") refere-se à porcentagem de crimes não solucionados ou punidos, à existência de um significativo número de infrações penais desconhecidas "oficialmente". Isso traz por consequência uma espécie de eleição de ocorrências e de infratores. O sistema penal, assim, acaba por se "movimentar" apenas em determinados casos, de acordo com a classe social a que pertence o autor do crime. Nesse contexto, "cifra negra" poderia ser conceituada como "um campo obscuro da delinquência", consistindo na "existência de um bom número de infrações penais, variável segundo a sua natureza, que não seria conhecido oficialmente, nem detectado pelo sistema e, portanto, tampouco perseguido". É certo que a cifra negra constitui a relação de crimes ocorridos, mas não registrados pelos órgãos oficiais, ou seja, forma a diferença entre o número de crimes praticados e o número de crimes conhecidos pelas autoridades competentes. Logo, a criminalidade real é maior que aquela registrada oficialmente. As causas são variadas, pode acontecer, pois o agressor é da própria família, então melhor não denunciar, ou mesmo por desacreditar na justiça, ou por medo da denuncia restar em mais uma vitimização. Ou seja, temos aí uma gama de crimes não conhecidos, que não chegam às portas do Poder Judiciário, e sequer serão realmente punidos.  Descritivamente: nem todo delito cometido é averiguado, nem todo delito averiguado é registrado judicialmente nem todo delito registrado judicialmente é averiguado pela policia, e quando averiguado pela policia, não é denunciado pelo Ministério Publico, ou há uma demora imensa para que a denuncia chegue ao Magistrado, e quando chega ao Magistrado nem sempre termina em condenação.

segunda-feira, 12 de maio de 2014

Ninguém é a favor de bandidos, é você que não entendeu nada Sobre as expressões que atravessam as gerações, passando de pai para filho e o pensamento ignorante que elas geram

Espectro político trata fundamentalmente de economia. Você acha que a propriedade privada é a raíz de todo o mal? Vá para a esquerda. Você acha que a propriedade privada pode resolver problemas? Vá para a direita.
Agora, deixe isso de lado. Não me importa, porque o ponto que quero discutir neste texto é comum a todos.
Algumas expressões vem se propagando por gerações. Como uma espécie de roteador que só replica o sinal, a nova geração repete os discursos da geração anterior. Me assusta ver que jovens, como eu, que tiveram acesso a boas escolas, conteúdos e discussões, estejam dando continuidade às falácias mal estruturadas dos mais velhos.
“Bandido bom é bandido morto.”
“Tem idade para matar, mas não tem idade para ir preso.”
“Direitos Humanos só serve para bandido.”
“Esse povinho defensor de bandido… quero ver quando for assaltado.”
Olha só: ninguém é a favor de bandido. Ninguém mesmo. Muito menos os direitos humanos. Ninguém quer que assalto, assassinato, furto e outros crimes sejam perdoados ou descriminalizados.
Você é que entendeu errado.
Por que alguém, em sã consciência, seria a favor de assaltos, homícidios, latrocínios e furtos? Você não deveria sair gritando palavras de ódio sem entender o argumento do qual discorda — a não ser que você se aceite como ignorante, isto é, que ignora parte dos fatos para manter-se na inércia do conforto.
Depois que este texto terminar, você pode continuar discordando, mas espero que desta vez com outros argumentos, argumentos fundamentados.

Antes de mais nada, o que você prefere?

Gostaria de propor dois cenários e que você escolhesse o que mais te agrada.
I) Uma sociedade onde há muitos criminosos, logo há muitos assaltos, latrocínios e homícidios. Entretanto, nesta sociedade, 99% dos crimes são resolvidos e os indivíduos são presos. Após voltarem as ruas, tornam-se reincidentes, ou seja, cometem novamente um crime. Mas nesta sociedade, este criminoso é pego novamente em 99% das vezes. Há pena de morte.
II) Uma sociedade onde quase não há criminosos. Os poucos criminosos que existem, quando pegos, são presos. Além de punidos com tempo de reclusão, os criminosos também são reabilitados (as maneiras são indiferentes, se com cursos profissionalizantes, tratamento psicológico, ambos ou outros) para que possam tentar uma nova vida. Não há pena de morte.
Qual você prefere?
Nenhum destes casos é o do Brasil. No nosso país e em muitos outros, temos altos índices de criminalidade, poucos programas de reabilitação e o senso comum vingativo de que o Lex Talionis desenvolvido há cerca de 4.000 anos ainda serve como solução. Todavia, há países parecidos com os dois casos propostos, o que torna tangível a estrutura. Mas e para o Brasil? Qual dessas você preferiria para o nosso país?
Posso te ajudar neste raciocínio com alguns pontos:
  • No primeiro caso, apesar de quase todos os criminosos serem pegos, o sofrimento das vítimas permanece. Como só se prende depois do crime, os lesados nunca terão a vida de um ente querido de volta, por exemplo.
  • No primeiro caso, além de muitos crimes, os criminosos ainda tem maior probabilidade de reincidir, ou seja, de cometer um crime por mais de uma vez.
  • Como são muitos criminosos, a economia do país perde força produtiva. Pessoas que poderiam estar trabalhando, pesquisando, empreendendo, estão no crime.
  • No primeiro caso, como são muitos casos a serem avaliados, o sistema jurídico pode vir a se tornar lento e ineficaz.
OBS: Em nenhum momento quero impor uma falácia de falsa dicotomia. Existem infinitas possibilidades de combinações aqui. Entretanto, este é apenas um exercício que facilita o entendimento do argumento.

A pessoa nasce bandida ou torna-se bandida?

Pergunta importante: você acha que as pessoas já nascem bandidas? O bebê — sim, aquele de colo — já é um bandido?
Prefiro pensar que ninguém acredita que as pessoas já nascem criminosas. É um pouco lunática a visão de um mundo Minority Report, onde o bebê será preso ali mesmo, nos primeiros momentos de vida. Mesmo para quem acredita neste mundo, o próprio filme trata do problema que isso poderia causar.
Partindo da pressuposição de que ninguém nasce bandido, vou utilizar um personagem fictício como exemplo: João, o bebê. Imagine o bebê da maneira como quiser, isso pouco importa, a única certeza que temos sobre João, o bebê, é que ele não nasceu bandido. É uma criança como qualquer outra, ainda dependente dos pais, que pouco faz da vida além de dormir e chorar. Mas neste mundo fictício, o tempo passou, e João cresceu. Aos 16 anos cometeu um latrocínio. Se João não nasceu bandido, então tornou-se bandido. A palavra "tornou-se" implica transformação e esse é o X da questão.
Os seres humanos se constroem com as experiências e aprendizados, portanto o meio em que se vive tem grande influência sobre ele. Sabendo disso, temos a visão clara de que algo acontece na sociedade que transforma as pessoas em marginais. E se você acha que não, talvez seja curioso saber que a taxa de homícidios no Brasil em 2008 era de 26,4 a cada 100.000 habitantes, enquanto que na Islândia o índice não passou de 1,8 a cada 100.000 no mesmo ano. Se o motivo desta diferença não for social, então só resta que seja biológico. Por ora, me nego a acreditar num "gene da marginalidade"¹.
O fato é: há algo na sociedade (que não será discutido neste texto) que leva as pessoas a cometerem crimes.
Quando você diz que reduzir a maioridade penal é uma boa ideia, você não está focando na raíz do problema, está apenas sugerindo uma maneira de remediar. E como veremos a frente, dado o nosso sistema, isto só aumenta a chance de criar um deliquente reincidente. Então note, pouco importa se a maioridade penal é de 16, 18 ou 21 anos se o país continua a formar criminosos. Devemos pensar em maneiras de diminuir a criminalidade, no processo que transforma as pessoas em transgressoras da lei, ou logo teremos mais presídios do que universidades e mais marginais do que cidadãos comuns.


¹ Há um estudo que relaciona os genes MAOA, DAT1, DRD2, com a predisposição à agressividade. Entretanto, Guang Guo, que é o responsável pelo estudo, afirma que a interação social é fator decisivo para o comportamento destes genes. Isto é, na maior parte dos casos, a presença dos genes não afeta jovens que possuem influências sociais positivas.

Construir mais penitenciárias e prender mais gente diminui a criminalidade?

O olhar crítico que às vezes não permeia a cabeça das pessoas é que prender as pessoas não faz com que menos pessoas se transformem em criminosas. Penitenciando apenas, você não resolve o problema, apenas posterga enquanto gasta o dinheiro público.
Assim como todo fumante sabe dos males do cigarro, todos que entram para o mundo do crime sabem o risco envolvido. Todo dia no noticiário vemos corpos estirados ao chão, seja do cidadão, do criminoso ou do policial. Não adianta termos penas mais severas: o brasileiro que se torna assaltante já não tem nada a perder, sabe que tem grandes chances de morrer de forma cruel.
Os criminosos brasileiros, depois de presos, ficam ainda mais propensos a perpetuar sua vida marginal. São três os principais motivos: (I) poucas empresas se propõem a contratar ex-presidiários, (II) o trauma vivido dentro da cadeia — como ela é aqui no Brasil — agrava as problemáticas psicológicas do indivíduo e, por fim, (III) não há um programa grande e estruturado de reabilitação de criminosos para que deixem a vida do crime.
Ninguém quer que criminosos não sejam punidos¹. Eles devem pagar suas penas conforme previsto em lei. O único problema é que a pessoa só vai presa depois de cometer o crime, isto é, depois que alguém já foi lesado. Não seria muito melhor se ao invés de precisar prender as pessoas depois do crime consumado, houvesse menos bandidos? Não seria melhor se os criminosos, após cumprirem suas penas, se reintegrassem a sociedade como parte da massa trabalhadora?
Ah, não dá? Dá sim. Na Suécia dá, por que aqui não daria? Vamos supor que você responda, de maneira óbvia, que é por causa da "cultura brasileira". Neste caso, eu devo concordar, porque, realmente, a cultura é diferente: aqui muita gente acredita que pena de morte resolve o problema enquanto lá eles fazem uso da reabilitação.
Deve ser por isso que aqui se constroem presídios e lá se fecham presídios.

Nils Öberg, responsável pelo sistema prisional da Suécia, disse sobre o fechamento presídios no país por falta de condenados:
“Nós certamente esperamos que nossos esforços em reabilitação e prevenção de reincidência tenham tido um impacto, mas nós achamos que isso sozinho não pode explicar a queda de 6%” — reafirmando que a Suécia precisa se esforçar ainda mais em reabilitar os prisioneiros para que eles possam retornar a sociedade.

¹ Existe uma corrente que acredita no chamado Abolicionismo Penal que não vê o sistema punitivista com estes olhos. Eu não conhecia esta ideia no momento em que escrevi o texto, mas um leitor me alertou pelo Twitter e por isso faço questão de incluir aqui.

Direitos Humanos para você também

O artigo 3 da Declaração Universal dos Direitos Humanos diz que:
“Toda pessoa tem direito à vida, à liberdade e à segurança pessoal.”
O trecho "Toda pessoa (…)" do artigo 3 inclui você.
Ninguém quer que você seja vítima de um crime. Todas as leis do código penal são pensadas para tentar lhe garantir este e outros direitos comuns a todos os seres humanos. Ninguém quer que os bandidos sejam especiais: o que o "povinho dos Direitos Humanos" quer é que a sociedade não crie mais marginais e que a quantidade dos existentes diminua. E é aí que está: infringindo os direitos humanos, você não alcança este objetivo.
O trecho “Toda pessoa (…)” do artigo 3 também inclui o marginal.
É confuso que o cidadão que clama tanto por justiça, que a lei seja cumprida, fique ávido para descumpri-la: tortura, homicídio e ameaça são crimes, mesmo que sejam contra um condenado. Então, não, bandido não tem que morrer, porque isso te tornaria tão marginal quanto.
Se você quer uma sociedade com menos criminosos, conforme discutido no começo deste texto, entenda o papel dos Direitos Humanos. O artigo 5 diz:
“Ninguém será submetido à tortura, nem a tratamento ou castigo cruel, desumano ou degradante.”
Ninguém lhe nega o direito a sentir dor, raiva e/ou tristeza após ter sido vítima de um crime. A culpa não é sua e isto nunca foi dito. Só quem é vítima sabe da própria dor. Mas o fato é que o olho por olho não te trará paz, não trará um ente querido de volta, não removerá seus traumas. O dente por dente só te levará para mais perto de uma sociedade violenta, onde o crime se perpetua e você pode ser vítima mais uma vez. Ninguém quer que você seja vítima outra vez.
A punição deve ser aplicada, sim. E com certeza será ainda melhor quando este indivíduo estiver apto a se tornar um cidadão comum, após cumprir sua pena, e nunca mais venha a causar problemas para a sociedade e para você. E é sobre isso que os Direitos Humanos falam.

Portanto entenda

Se você leu o texto um pouco mais exaltado, talvez tenha perdido algum trecho importante, portanto aqui vão alguns dos principais pontos:
  1. Ninguém nasce bandido. A estrutura social, de alguma maneira, transforma as pessoas em criminosas.
  2. Entender os motivos que levam a formação de criminosos e resolvê-los é mais importante do que puni-los com mais severidade. Se não formarmos criminosos, as pessoas não precisam ser vítimas.
  3. Todo crime deve ser devidamente punido, mas a maneira de punir pode influenciar na reincidência do criminoso, que fará novas vítimas.
  4. Construir presídios, prender mais pessoas, não evita que mais pessoas se transformem em bandidos.
  5. O que aprendemos com os países mais desenvolvidos é que reabilitar marginais colabora com a redução da criminalidade.
  6. Infringir os Direitos Humanos de qualquer pessoa é atentar contra a vida e, no caso do marginal, vai na contra-mão da reabilitação.
E novamente:
Você tem o direito de ficar desolado e/ou enfurecido por ter sido vítima. Ninguém é a favor do crime.
Você é que não tinha entendido antes.

Pós-escrito sobre os espantalhos

Esta seção foi incluída no dia 01/03/2014, após mais de 300.000 visualizações do texto.
Acho muito positivo que as pessoas discordem. É somente com o confronto de ideias que podemos observar o que faz e o que não faz sentido. Entretanto, algumas pessoas tentaram refutar o texto com a chamada “Falácia do Espantalho”.
A expressão “Falácia do Espantalho” descreve um tipo de argumento falacioso, inválido. Esta falácia se dá quando um dos interlocutores distorce o argumento do outro, transformando-o em algo simplista ou exagerado, de forma que torne-se algo fácil de se refutar. O problema com este tipo de argumento é que ele não lida com a alegação real, ao contrário, ele inventa uma nova, na tentativa de ridicularizar a alegação inicial.
Se isto não ficou claro, não se preocupe, pois a seguir listarei alguns exemplos. Parafrasearei algumas das coisas que li e ouvi, e então esclarecerei.
Espantalho #01
O texto diz que a culpa é da sociedade.
Esta falácia se dá por causa do trecho “O fato é: há algo na sociedade (…) que leva as pessoas a cometerem crimes”.
Apenas como exercício, imagine um campo onde há dezenas de espécies de árvores frutíferas. Neste campo, crianças brincam e comem frutas diretamente das árvores. Os pais observam os filhos. Após algum tempo, crianças começam a apresentar vermelhidão na pele, dificuldade para respirar, vômito e diarreia. Muitas delas morrem.
A culpa é do campo? Não. A culpa é das mamonas, que contém ricina.
Utilizando o cenário-exemplo proposto, é bem razoável que os pais se atentem ao fato de que há algo no campo que leva as crianças ao óbito. Dado isto, é melhor que investiguem as causas das mortes ao invés de somente comprarem remédios ao acaso. Os remédios não evitam que mais crianças se intoxiquem. Ainda no exercício, a melhor saída seria identificar que o problema são as mamonas e, a partir daí, cortar as árvores que as produzem.
Culpa é a responsabilidade de um ou mais indivíduos por um ato que prejudica alguém. Se um indivíduo decide roubar ou matar outra pessoa, a culpa pela morte é dele e somente dele. Repare que "(…) leva as pessoas a cometerem crimes." deixa claro que quem comete os crimes são as pessoas. Sociedades não cometem crimes, seus indivíduos sim. Entretanto, nada disso impede que os indivíduos atuem em busca de uma mudança na estrutura da comunidade, de forma a mitigar a criminalidade.
Espantalho #02
O texto propõe que o Brasil deve virar a Suécia da noite pro dia.
O texto não diz isso. Nem diz que o Brasil parece a Suécia, ao contrário, diz que a mentalidade sobre este assunto é totalmente diferente.
Quando pensamos em mudar as políticas existentes, sempre há possibilidade de aproveitar o aprendizado de outros países. A Suécia, como muitos outros países nórdicos, apresenta excelentes características e índices relacionados à qualidade de vida.
A maioria das mudanças políticas não apresenta resultados imediatos. Leva tempo para que a sociedade se reestruture e modifique seus processos. Mas a mudança parte da mentalidade e tem que começar em algum momento.
Espantalho #03
O texto diz que temos que privilegiar criminosos.
O texto não diz isso. Não torturar e privilegiar são coisas distintas.
Muitas vezes, uma prisão em flagrante requer uso de força, principalmente quando o criminoso reage à voz de prisão. Não há nada de errado nisso, pois é impossível conter um indivíduo relutante com delicadeza. Entretanto, há uma diferença gritante entre uso de força necessária e tortura.
Segundo o artigo 301 do código Código Processual Penal, qualquer cidadão pode prender uma pessoa em caso flagrante delito e, neste caso, deve conduzi-la às autoridades responsáveis. Alternativamente, o cidadão que flagrar o crime pode conter o criminoso e chamar as autoridades responsáveis.
Como exemplo, em um acontecimento recente, um jovem foi espancado e acorrentado pelo pescoço em um poste, nu. O que deve ser avaliado neste caso é se o adolescente foi pego em flagrante, se a polícia foi avisada e se houve tortura. Se alguma das condições previstas em lei não foi atendida, esta foi uma prisão ilegal. E se houve tortura, os responsáveis pela prisão cometeram um crime.
Espantalho #04
O texto diz que não há impunidade no Brasil e que o cidadão não deve se indignar.
O texto não diz isso. O brasileiro deve se indignar, pois os nossos números passam longe de representar o cenário ideal.
O Estado brasileiro se demonstra incapaz de resolver o problema, tanto por uma via, como pela outra. É urgente a necessidade de uma mudança sistemática. Assim, há de se discutir os caminhos possíveis para tal. O texto se compromete a apresentar apenas um dos pontos importantes que devem ser discutidos nesta pauta, mas não insinua nenhuma fração da falácia acima.
Espantalho #05
O texto diz que as pessoas pobres não tem escolha, a não ser a criminalidade.
O texto não diz isso. O texto nem mesmo faz distinção de classes sociais.
Normalmente, esta falácia vem acompanhada de um exemplo onde dois irmãos gêmeos estudam na mesma escola, tem os mesmos amigos e mesmo assim optam por caminhos distintos, onde um se torna criminoso e o outro não. Neste caso, é importante notar que não há o caso onde duas pessoas vivem exatamente as mesmas experiências e tem exatamente as mesmas percepções. Mesmo que possuam uma grande semelhança biológica, dois irmãos nunca são tratados pelos demais como uma só pessoa. Além disso, a semelhança biológica não garante a semelhança entre personalidades.
Ser um cidadão que não vive de crime é sim uma escolha. As pessoas quase sempre tem escolhas, mas vale lembrar que às vezes as possibilidade parecem distantes. Por exemplo: qualquer um pode ser tão rico e famoso quanto o Bill Gates, basta fundar uma empresa como a dele. A questão central é quão fácil ou difícil é tomar certas escolhas para si.
A proposta do texto é incentivar uma discussão em torno de como fazer as pessoas não optarem pelo crime, e não impor a ideia conformista de que as coisas são do jeito que são e nada pode ser feito.


sexta-feira, 9 de maio de 2014

para refletir sobre a justiça pelas próprias mãos

O espírito do Capitalismo

O capitalista remunera o trabalho com $100 (D), esse trabalho gera mercadorias (M), e essas mercadorias são vendidas por $120 (D'). Segundo Marx, isso só é possível de ocorrer porque há uma parte do trabalho que não foi remunerada pelo capitalista (D'-D).
Essa diferença é justamente a mais-valia, que é a mensuração exata da "exploração laboral" — ou seja, o trabalhador prestou um serviço para o capitalista e não obteve a devida remuneração.
O que há de errado com essa teoria da exploração de Marx é que ele não compreende o fenômeno da preferência temporal.
Você realmente acredita que ter $1.000 hoje é o mesmo que ter $1.000 apenas daqui a 5 anos (e assumindo zero de inflação de preços), mesmo que ambos os valores contenham o mesmo tempo de trabalho?
Pois é exatamente esse o raciocínio por trás de toda a análise marxista da exploração.
Os capitalistas adiantam bens presentes (salários) aos trabalhadores em troca de receber, somente quando o processo de produção estiver finalizado, bens futuros. Existe necessariamente uma diferença de valor entre os bens presentes dos quais os capitalistas abrem mão (seu capital investido na forma de salários e maquinário) e os bens futuros que eles receberão (se é que receberão).
Os capitalistas, ao adiantarem seu capital e sua poupança para todos os seus fatores de produção (pagando os salários da mão-de-obra e comprando maquinário), esperam ser remunerados pelo tempo de espera e pelo risco assumido. Por outro lado, os trabalhadores, ao receberem seu salário no presente, estão trocando a incerteza do futuro pelo conforto da certeza do presente.
O fato de o trabalhador não receber o "valor total" da produção futura nada tem a ver com exploração; simplesmente reflete o fato de que é impossível o homem trocar bens futuros por bens presentes sem que haja um desconto. O pagamento salarial representa bens presentes, ao passo que os serviços de sua mão-de-obra representam apenas bens futuros.
A relação trabalhista é apenas uma relação de troca entre bens presentes (o capital e a poupança do capitalista) por bens futuros (bens que serão produzidos pelos trabalhadores e pelo maquinário utilizado, mas que só estarão disponíveis no futuro).
Böhm-Bawerk expressou tudo isso de maneira bem mais resumida: "Parece-me justo que os trabalhadores cobrem o valor integral dos frutos futuros do seu trabalho; mas não é justo eles cobrarem a totalidade desse valor futuro ‘agora’."
http://www.mises.org.br/Article.aspx?id=1856
Você realmente acredita que ter $1.000 hoje é o mesmo que ter $1.000 apenas...
mises.org.br

segunda-feira, 28 de abril de 2014

perseguição obssesiva .. bulling... stalking

Stalking - perseguição obsessiva

Marcos Henrique Caldeira Brant - Juiz de Direito da 11ª Vara Criminal da Comarca de Belo Horizonte Publicação: 24/05/2013

Stalking é uma palavra de origem inglesa derivada da tradução do verbo to stalk, que pode ser entendido como ficar à espreita, vigiar, espiar. E, no campo jurídico penal, significa perseguição obsessiva a uma pessoa a ponto de causar-lhe medo e ansiedade, ficando gravemente prejudicada em seu estilo de vida. O termo stalking começou a ser usado no final da década de 1980 para descrever a perseguição insistente a celebridades pelos seus fãs. Em 1990, nos Estados Unidos, inicialmente na Califórnia, a conduta foi criminalizada. Atualmente, vários países criminalizam esse tipo de conduta inoportuna. Altas são as estatísticas da ocorrência de stalking nos países desenvolvidos. Anualmente, na Inglaterra, cerca de 600 mil homens e 250 mil mulheres são vitimados.

O agente acometido pelo stalking tem uma conduta de assédio correspondendo a uma obsessiva perseguição ativa e sucessiva à vítima, sempre na busca incessante de manter-se próximo a esta, por motivos variados, como amor, desamor, vingança, ódio, brincadeira e inveja. Como exemplos das táticas de perseguição e meios executórios temos: chamadas no telefone móvel ou celular; espera na saída do trabalho ou residência; envio de presentes indesejados; encontros provocados; cartas; mensagens no celular; e-mail e outros meios inconvenientes de impor a presença refutada e agredir psicologicamente a vítima.

O stalking muito ocorre por meio da internet, caracterizando-se o que se chama de cyberstalking, com o envio de mensagens eletrônicas, recados, convites insistentes ou ofensas nas redes sociais. Em casos extremos, o stalking envolve a intimidação explícita da vítima com ameaças e ações violentas, como, por exemplo, ofensa ao patrimônio e até a integridade física.

Muito comum a ocorrência do stalking no caso de rompimento de um relacionamento amoroso em que o homem ou mulher irresignados, e movidos por sentimento de perda que transborda para o ódio, “patologia do apego”, promovem uma perseguição infernal ao ex.

A psicologia forense classifica os stalkers nas seguintes categorias: rejeitado, perseguidor, retardado, vingativo, erotomaníaco e sádico. As ações dos stalkers são vistas como perigosas em diferentes níveis, conforme o sentimento da vítima.

Pela atual legislação brasileira, o stalking configura contravenção de perturbação da tranquilidade, tipificada no artigo 65: “Molestar alguém ou perturbar-lhe a tranquilidade, por acinte ou por motivo reprovável. Pena – prisão simples, de quinze dias a dois meses, ou multa”. Portanto, infração penal de menor potencial ofensivo, afeta ao Juizado Especial, mas com a possibilidade de aplicação das medidas protetivas previstas na Lei Maria da Penha caso a perseguição esteja relacionada ao gênero feminino, prevalecendo as relações domésticas.

A proposta de reforma do Código Penal, em tramitação no Congresso Nacional, prevê criminalização do stalking, passando a ser infração penal de médio potencial ofensivo. Está inserido como tipo penal derivado do crime de ameaça.

Vejamos:

“Ameaça – Artigo 147 — Ameaçar alguém por palavra, escrito ou gesto, ou qualquer outro meio simbólico, de causar-lhe mal injusto e grave. Pena – prisão de seis meses a dois anos.

Perseguição obsessiva ou insidiosa. §1º. Perseguir alguém, de forma reiterada ou continuada, ameaçando-lhe a integridade física ou psicológica, restringindo-lhe a capacidade de locomoção ou, de qualquer forma, invadindo ou perturbando sua esfera de liberdade ou privacidade. Pena — Prisão, de dois a seis anos, e multa.”

Mantida essa redação, o sujeito passivo será qualquer pessoa, homem ou mulher. Note que estarão protegidas a integridade física e psicológica da vítima. O tipo também é bastante amplo, pois prevê punição para aquele que “de qualquer forma” atuar para invadir ou perturbar a liberdade ou privacidade do ofendido. O sentimento de quem é perseguido em relação ao perseguidor é o que efetivamente categoriza o crime, que é de ação penal pública condicionada à representação. Tal previsão se faz necessária, haja vista caber à vítima a ponderação sobre os custos pessoais a serem enfrentados pelo processamento da ação penal, uma vez que, em regra, o agente provocador é pessoa de convívio próximo.

segunda-feira, 21 de abril de 2014

A vulnerabilidade e a coculpabilidade segundo o professor Eugenio Raul Zaffaroni


Em regra, há uma relação inversamente proporcional entre “poder” e “vulnerabilidade”.
Daí surge o “esforço pela vulnerabilidade”, ou, mais especificamente, “el esfuerzo personal del sujeto por alcanzar la situación concreta de vulnerabilidad”,58 que será o verdadeiro elemento definidor do grau de culpabilidade de cada agente. A relação entre “poder”, “vulnerabilidade”, “esforço”, “culpabilidade” e “reprovação” dá-se, como regra geral, da seguinte forma: quanto mais próxima do poder a pessoa encontra-se, menor é o seu estado de vulnerabilidade e maior será o esforço que terá de fazer para ser selecionada, sendo maior a sua culpabilidade, pois maior a reprovação de seu ato. Em sentido contrário, pode-se afirmar que quanto mais longe do poder e mais próximo do locus vulnerável está o indivíduo, mais vulnerável será e menor deverá ser o seu esforço para ser selecionado pelo poder punitivo, sendo menor a sua culpabilidade em razão da menor reprovação de seu ato. 
Esse esquema é legitimador do exercício judicial porque “ésa es la medida del esfuerzo que la persona realiza conspirando contra el próprio derecho penal, em cuanto a su cometido pacificador y reductor da violência.59 O esforço que o agente faz para chegar à posição de vulnerabilidade, além de ser contrário aos fins humanitários, legítimos e éticos do direito penal, é a contribuição pessoal do sujeito às pretensões legitimantes do poder punitivo invariavelmente deslegitimado.

 58 Tradução livre: o esforço pessoal do sujeito para alcançar a situação concreta de vulnerabilidade (ZAFFARONI; ALAGIA; SLOKAR (2002); ob. cit., p. 654).
59 Tradução livre: essa é a medida do esforço que a pessoa realiza conspirando contra o próprio direito penal, ou seja, contra a própria tarefa pacificadora e redutora da violência (ZAFFARONI; ALAGIA; SLOKAR (2002); ob. cit., p. 655).
60 ZAFFARONI (1999), op. cit., p. 266. Zaffaroni ainda alerta que “el enunciado de este principio no es reversible: del aserto de que, como requisito de mínima racionalidad, nadie puede ser penado si no ha obrado con cierto ámbito de autodeterminación em el momento del hecho, y de que nunca puede serlo en mayor medida que la indicada por este ámbito, no puede deducirce 
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